Levítico 19

Levítico 19

Depois das relações com Deus (Levítico 17) e das relações de intimidade entre pessoas (Levítico 18), Levítico 19 trata de relações sociais em termos mais amplos. São leis diversas, que lidam com aspectos do cotidiano que interferiam nas relações entre as pessoas. E assim interferiam também nas relações com Deus e com a natureza. 

É importante observar essa integração dos âmbitos da vida. Nós hoje vivemos num mundo em que facilmente se separam âmbitos, como se não tivessem a ver um com o outro. Aqui vemos que a energia disruptiva do pecado, quando livre, se espalha e acaba contaminando tudo ao redor. No capítulo 18, por exemplo, observamos como a terra reage às ações das pessoas que vivem sobre ela, e que muitas vezes sequer se dão conta de que a terra pudesse ter “sentimentos”. Este “desencantamento do mundo” às vezes nos impede de perceber conexões que para os textos bíblicos são naturais, mas para as quais não temos mais compreensão.

Se olharmos com atenção, as diferentes instruções em Levítico 19 estão perpassadas por um espírito, uma postura, que as une num todo: pensar no outro, não só em si próprio. Ter em vista as necessidades do outro, não só as próprias. Preservar a santidade divina (19.1-8), pensar concretamente nos desfavorecidos (19.9-10,13-15), não permitir falsidade que rasgue o tecido da verdade que mantém a sociedade integrada (19.11-12). Em síntese, respeitar a vida do outro, tanto em pensamento como nas ações concretas (19.16-17), o que se deixa expressar da melhor maneira pelo grande mandamento: “amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Levítico 19.18). O restante do capítulo segue tirando todo tipo de conclusões deste grande mandamento. Ao longo dele ressoa constantemente uma frase: “Eu sou o Senhor, o Deus de vocês”. Ela lembra sempre de novo a fonte do amor que traz shalom, paz e integridade, a toda a criação.

Dia 108 – Ano 1

Levítico 17

Levítico 17

O dia anual de expiação, sobre o qual lemos em Levítico 16, mostra dois movimentos espirituais que perpassam o dia a dia do povo de Deus. 

O primeiro movimento é o do pecado. Não é um movimento só, mas um conjunto caótico de forças que atuam em direções descoordenadas, mas sempre com o mesmo efeito: invadem o centro pessoal, e ali desconectam, rompem, fragmentam, separam. E espalham os efeitos nefastos disso para fora, na relação com Deus, na vida pessoal, nas relações na sociedade e na natureza.

O segundo movimento é o do amor. O amor não invade. Convida, atrai “com cordas humanas, com laços de amor”, como diz o profeta Oséias (11.4), rememorando aqueles tempos no deserto. Desde a Tenda, no centro do acampamento, o amor espalha os seus efeitos benéficos para fora, na relação das pessoas com Deus, consigo próprias, nas relações na sociedade e na natureza. O perdão dos pecados e a purificação das impurezas quer propiciar novos começos, novas oportunidades para este amor divino ser recebido no centro pessoal de cada indivíduo, e dali espalhar reconciliação, restauração.

Os capítulos finais do livro de Levítico querem mostrar como esse amor quer fazer a diferença no dia a dia do povo de Deus. Como o amor sempre quer se tornar concreto, ele vem expresso na linguagem do cotidiano, da vida nossa de cada dia. E como ali ele arrisca se diluir no meio de tantas coisas que nos ocupam, é fácil perder de vista o propósito maior de todas as instruções que encontramos nestes capítulos. 

Primeiro, há que assegurar que a relação com Deus seja única e venha em primeiro lugar, pois é dali que emana o amor e a vida. Naquela época, a relação com Deus se expressava por meio de rituais de sacrifício de animais. Sobre isto trata Levítico 17, com duas tônicas: deixar de se prostituir com os demônios (17.7), e respeitar o sangue, que tem relação íntima com a alma, e por isso veicula a vida (17.11).

Dia 106 – Ano 1