Davi vai ficando mais e mais poderoso. Na perspectiva do texto bíblico, isso trazia mais e mais perigo. “O poder sobe à cabeça”, como diz o ditado. 2 Samuel 11 mostra como Davi também acabou se deixando enredar pelo poder, com graves danos para si próprio, para sua família e para a vida de pessoas inocentes.
A história já começa com uma nuvem carregada no ar. “No tempo em que os reis saem” para guerrear, Davi “ficou em Jerusalém” (v.1). Não é dito o porquê. A sequência mostra um homem se tornando indulgente. Há ironia na observação: “De tardezinha, levantando Davi da cama” (v.2).
Nessa indolência, Davi mata o tempo passeando no terraço. Aí seu olhar é atraído por uma cena: uma bela mulher tomando banho (v.2). Resistir, seria coisa para um homem comum, não para um rei que pode fazer o que quiser. O resto é consequência. Ela é mulher de um de seus mais bravos guerreiros, que no momento está no campo de batalha (onde o próprio Davi também deveria estar, isso é insinuado pelo texto). Mesmo sabendo disso, Davi manda chamá-la e a possui.
A mulher engravida (v.5). Aí começa um efeito dominó. A solução para Davi é chamar o homem de volta, para que ele durma com a esposa e todos achem que o filho que vai nascer é dele. Mas não funciona. Urias, um estrangeiro, é mais honrado que o rei de Israel. As razões que ele apresenta para não ir para casa (v.11) seriam as esperadas, na época, para soldados em serviço. Davi apela (v.12-13), mas não adianta.
Um erro vai levando a outro, e o ungido de Deus vai se afundando em suas próprias elucubrações. A solução é dar um jeitinho para que o homem morra em combate (v.14-25). O comandante Joabe, também ele com culpa no cartório, participa da trama que premeditadamente tira a vida de um inocente. Passado o luto, Davi traz a mulher para o palácio, e ela se torna uma de suas esposas (v.27).
Esse é um dos capítulos na Bíblia que desafia leituras que tendem a glorificar “heróis da fé”. Admirável é que o texto bíblico conte essa história do jeito que aqui ela é contada. À luz dela, e de outras tantas parecidas com ela, fica destituída de qualquer falsa modéstia a palavra do salmista: “Não a nós, Senhor, não a nós, mas ao Teu nome dá glória, por amor da Tua misericórdia…” (Salmos 115.1).
Dia 268 – Ano 1