Isaías 1.13-15

Isaías 1.13-15

A relação entre os comunicantes é que determina a cada momento a verdade das proposições, dos processos de comunicação que são o substrato dos textos bíblicos. Verdade, mais que atributo cognitivo, é a encarnação desses atributos em caminhos de vida. Trazer ofertas ou não, não é a questão principal. A questão principal é a verdade vivencial que acompanha ou não tais ofertas. Quando a oferta apresentada é “oferta de ilusão”, a palavra divina é: “Parem de trazer” tais ofertas (Isaías 1.13). 

Há coisas que jamais se deveria misturar. Aqui está o foco no qual convergem as frases anteriores. “Iniquidade com culto religioso”, diz o Senhor, “não posso aturar isso” (1.13). A palavra áven (“iniquidade”) está associada ao mau uso do poder, em sentido amplo. A percepção de poder se instala no coração e se expressa em palavras e ações. No contexto, ela aponta para manipulações do religioso por detentores de poder econômico e político. De alguma forma essas manipulações, como também a própria ambição de poder, correspondem a desejos do povo. Que assim se deixa seduzir e peca junto. Governantes foram avaliados negativamente por seus pecados, e por terem levado o povo a participar desses pecados.

Quando vida e culto destoam, o próprio culto se torna “odioso” a Deus (Isaías 1.14). Ele deixa de ser uma torá (“instrução”) e passa a ser uma toráh (“fardo”). O incenso que acompanha e representa as orações, se torna “incenso abominável” (1.13). “Quando vocês me levantam as mãos em oração, tapo os meus olhos. Mesmo que multipliquem orações, não as escuto” (1.15). E agora vem a razão dessa inconformidade: “As mãos de vocês estão cheias de sangue” (1.15).

Que significa isso? Se se perguntasse aos participantes do culto individualmente, se têm consciência de que as mãos que elevam a Deus em oração estão manchadas de sangue, provavelmente a grande maioria negaria, talvez com veemência. Aqui se encontra um importante fator de dissonância entre o modo como pessoalmente vemos a nós próprios, e o modo como Deus nos vê. Chamar a atenção para essa dissonância é um dos focos da profecia bíblica. 

Mãos manchadas de sangue podem significar mais do que matar alguém diretamente. Há maneiras de contribuir indiretamente para a morte de pessoas. Quando inocentes são mortos por não terem acesso a recursos básicos, isso traz alguma forma de culpa a todos que direta ou indiretamente dela participam. É uma culpa objetiva, real, mesmo que não haja sentimentos subjetivos que lhe correspondam. O quanto isso é hediondo aos olhos de Deus, pudemos ver em 2 Reis 24.4: Jerusalém estava “cheia de sangue inocente”, por isso o povo de Deus foi rejeitado. E por isso também seu culto está sendo rejeitado.

Dia 8 – Ano 2