Isaías 18

Isaías 18

Isaías 18, um capítulo enigmático, parece ser continuação de Isaías 17, voltada para o reino de Judá. A “terra do bater de asas para além dos rios da Etiópia” (18.1) seria algum lugar no norte da África, lar de “homens altos de pele lisa” (18.2; 18.7). De alguma maneira eles são envolvidos em uma espécie de articulação política que inclui Judá, talvez contra os assírios, ou mesmo contra os egípcios, que seriam os vizinhos mais próximos. Mais informações o texto não dá. Nesses casos, o mais indicado é prestar atenção no que o texto diz com suficiente clareza. 

A imagem da “bandeira” erguida nos montes já apareceu várias vezes, sempre com o mesmo sentido, mas com aplicações diferenciadas. Em Isaías 5.26, uma bandeira é hasteada num lugar alto para que “as nações” a possam ver de longe. Os assírios a vêem e reagem ao sinal mandando tropas para a Palestina. Em Isaías 11.12, a bandeira hasteada é um sinal para que as nações devolvam os israelitas exilados ou refugiados. Em Isaías 13.2, ela é um sinal para que as nações marchem contra Babilônia e executem o julgamento divino contra ela. Aqui em Isaías 18.3, a bandeira retorna, agora acompanhada de um alerta às nações. “Quando se erguer a bandeira sobre os montes, fiquem de olho”. 

Subitamente o foco muda, e vemos mais Alguém “de olho”. Deus, em silêncio, acompanha tudo do “lugar da Sua morada” (18.4). E aí o texto descreve uma videira arrasada (18.5-6). A videira é símbolo de um povo, de sua energia e vitalidade. A “videira de Deus”, Israel e Judá, falhou em dar os frutos esperados (Isaías 5.4; 5.7), e por isso ela é invadida e arrasada por nações chamadas pelo próprio Deus, ao erguer a bandeira para sinalizar-lhes que venham.

Essas imagens expressam um mistério nas relações de Deus com os povos, e especialmente com o Seu povo escolhido. Deus em silêncio, no céu, acompanhando tudo com muita atenção, a atenção que o texto pede também aos participantes dos acontecimentos “aqui embaixo”. Para estes, Deus parece ter escondido o Seu rosto (Isaías 8.17). A “ausência” de Deus dá lugar a diferentes reações. Muitos parecem ver aí uma chance para “se dar bem”, para fazer com liberdade coisas que “a lei divina proíbe”. Esse é um tema recorrente na Bíblia. O Salmo 10 é um exemplo. “Por que permaneces ao longe, Senhor? Por que Te escondes? (Salmos 10.1). “O perverso se gloria na cobiça da sua alma” (10.3). “Não há Deus”, diz (10.4). Expande-se na maldade, seguro de sua impunidade (já que não há Deus): “Jamais serei abalado, … nenhum mal me alcançará” (10.6). No seu íntimo, diz: “Deus se esqueceu, virou seu rosto, jamais verá isso” (10.11).

A mensagem de Isaías é que Deus está presente em Sua “ausência”. E ativo em Seu “distanciamento”. A destruição do Seu povo, ostensivamente causada por nações inimigas, tem que ser vista desde a perspectiva mais ampla do julgamento divino. A reação do profeta, e do grupo ao redor dele, é: “Esperarei no Senhor, que esconde o Seu rosto da casa de Jacó, por Ele aguardarei” (Isaías 8.17). E assim a percepção da ausência de Deus, e mesmo do Seu julgamento, podem se converter em aprofundamento da fé e da esperança.

Dia 37 – Ano 2