Isaías 23 (2) 

Isaías 23

As profecias relacionadas aos povos (Isaías 13 — 23) têm seu ápice nessa “palavra pesada” contra os fenícios, mais exatamente a cidade portuária de Tiro. Em termos de poder político, os fenícios nunca foram muito expressivos. Talvez a colocação dessa palavra profética nesse ponto da narrativa queira sinalizar, entre outras coisas, que o poder político nem é o que mais conta.

“Uivem, navios de Társis” (Isaías 23.1). O poder dos fenícios era econômico. Eles dominavam o comércio marítimo de todo o Mediterrâneo. E enriqueciam, e enriqueciam os que com eles negociavam. Esse poder dava aos fenícios o poder de “colocar coroas” (Isaías 23.8), de decidir sobre os governos. A perspectiva profética destapa o que está no fundo dessa ciranda de poder financeiro, e lhe dá nome: “prostituição” (23.17).

Isaías 2.6-22 pinta um quadro de como a ganância e a soberba minaram a “casa de Jacó”, encheram Jerusalém de “prata e ouro” e transformaram Israel em “terra de ídolos” (Isaías 2.6-8). E vê o problema de fundo nos “navios de Társis” e em toda a beleza que transportam (Isaías 2.16). Tempos antes, Israel já havia sido tomado por esse falso brilho. A glória do reinado de Salomão era mantida por sua “frota de navios de Társis” (1 Reis 10.22), que anualmente despejavam em Israel 666 talentos de ouro (1 Reis 10.14), cujo peso faria afundar o povo de Deus, sem que se percebesse.

Tiro se prostituía “com todos os reinos da terra” (Isaías 23.17). Sua riqueza e sua destruição se tornaram proverbiais na narrativa bíblica. O profeta Ezequiel traz uma longa profecia sobre Tiro, de como sua destruição será lamentada por reis e comerciantes (Ezequiel 26.15-17; 27.35-36). Ela se achava de “perfeita beleza” (Ezequiel 27.3). Sua riqueza era cantada em verso e prosa. Os “navios de Társis”, que transportavam suas mercadorias, lhe traziam riqueza e fama (Ezequiel 27.25). E isso lhe subiu à cabeça. “Sou Deus”, disse, e começou a pensar que seu coração era o coração de Deus (Ezequiel 28.2), o que dá para fazer de muitas maneiras e com muitos disfarces. 

O rei de Tiro foi com o tempo tomando feições míticas (Ezequiel 28.12-15). Mas o coração de Deus, é revelado ao profeta. Que revela a verdade do coração do rei. O diagnóstico é preciso: “Com a multiplicação do teu comércio, o teu interior foi se enchendo de violência” (Ezequiel 28.16). “Pela multidão das tuas iniquidades, pela injustiça do teu comércio, profanaste os teus santuários” (Ezequiel 28.18). Não será por nada que a destruição da cidade cujo poder concorre com o poder de Deus, onde a boa criação divina é transformada em mercadoria, Babilônia a grande (Apocalipse 17-18), será pintada com as mesmas tintas com que em Isaías e Ezequiel se pinta a destruição de Tiro.

Dia 42 – Ano 2