2 Reis 14.1-6

2 Reis 14.1-6

Depois de um capítulo dedicado aos reis de Israel, o texto retorna a Judá. Amazias, filho de Joás, já tinha sido anunciado em 2 Reis 12.21, e é agora apresentado (2 Reis 14.1-2). Amazias “fez o que era reto diante dos olhos do Senhor” (14.3), como seu pai Joás, embora “ainda não como seu pai Davi”. Entre as notícias relacionadas ao seu reinado, o texto destaca uma. Amazias pune os culpados pelo assassinato do seu pai (14.5). “Mas os filhos dos assassinos ele não matou, conforme está escrito no livro da Instrução” (14.6). Deuteronômio 24.16 diz: “Os pais não serão mortos por causa dos filhos, nem os filhos por causa dos pais. Cada um será morto pelo seu próprio pecado”.

Essa decisão de Amazias tem implicações de longo alcance. Temos visto com certo desgosto as matanças que às vezes acompanhavam a ascenção de um rei ao trono. Como era costume entre povos vizinhos, o rei que tomava posse fazia questão de eliminar todo potencial candidato ao trono. E isso quase sempre significava sua própria família. Gente morria pelo simples fato de ser o que eram. Os reinos desunidos de Israel não tardaram a adotar estas políticas. E isso, quando a Instrução divina condenava explicitamente tais ações. Faz parte do processo pedagógico divino que as pessoas adquiram sempre mais consciência de que, mais que simples membros de um povo ou de uma tribo, são indivíduos. E que assim é que Deus trata os humanos feitos à Sua imagem.

O gesto de Amazias, portanto, no contexto é revolucionário. Pessoas não devem pagar por crimes que outros cometeram, mesmo que esses outros sejam pai ou filho. Irmão de rei não deve pagar com a vida o fato de ser irmão do rei. Se ele conspirar, será punido por sua conduta. Filhos não pagam por crimes dos pais, nem pais por crimes dos filhos. Uma questão espinhosa, que não devemos ignorar, é a eliminação de várias gerações de uma família por causa dos crimes dos pais, como é dito em 1 Reis 21.22, por exemplo, quando o profeta Elias diz ao rei Acabe que sua família será destruída como foi a de Jeroboão e a de Baasa, dois reis anteriores. É bem provável que isso incluiu a morte de inocentes. Uma legitimação para tais ações poderia até ser encontrada em Êxodo 20.5, sobre o Deus que “visita a iniquidade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração”, uma cláusula que inclusive acabou sendo inserida dentro do texto que contém os Dez Mandamentos.

Talvez o mais sábio seja, no momento, simplesmente reconhecer as contradições aí envolvidas. Valorizando a atitude de Amazias, que é registrada na narrativa bíblica justamente depois destes eventos. E valorizando  o princípio da Instrução divina que ele reflete. Um resoluto encaminhamento dessa questão talvez tenha que esperar a chegada do Príncipe da Paz (Isaías 9.6), do Servo que, sem injustiça ou crime de sua parte, assume voluntariamente sobre si “o castigo que nos traz a paz” (Isaías 53.9,5). O Inocente que carrega o fardo de todos os inocentes, para cortar pela raiz a injustiça que continua sempre de novo causando a morte de inocentes.

Dia 357 – Ano 1