Êxodo 40

Êxodo 40

O relato da construção da Tenda de Deus (Êxodo 36 — 39) faz analogia com o relato da criação do mundo. Significativo é que o que, no relato da criação, é trabalho de Deus (fazer e “ver”), aqui é trabalho do povo e de Moisés. “Assim os filhos de Israel fizeram toda a obra. E Moisés viu toda a obra, e eis que a fizeram como Deus havia determinado, assim a fizeram. E Moisés os abençoou” (Êxodo 39.42-43).

Isso sinaliza um elemento essencial do projeto pedagógico de Deus. Deus quer ajudar Seu povo a aprender a aprender, dar-lhe oportunidades concretas de assumir as responsabilidades, e Ele próprio ir ficando mais na retaguarda. Seu propósito começa a ser alcançado quando nós arregaçamos as mangas e assumimos o nosso lugar como parceiros na continuidade da criação. Isso não significa que Deus sai de cena. Pelo contrário, Ele vem para acampar no coração da Tenda, no Santíssimo. Ali o céu e a terra estarão reunidos, como casa de Deus.

O capítulo final do Livro de Êxodo relata essa vinda de Deus ao mundo, que vinha sendo preparada detalhe por detalhe, desde que Ele apareceu no alto do monte Sinai (Êxodo 19). Mas antes, uma última revisada. Êxodo 40 é como um espelho em miniatura de todo o trecho de Êxodo 25 – 39. Também ele é dividido em duas partes. Na primeira, Deus diz a Moisés, detalhe por detalhe, como ele deve erguer a Tenda (40.1-15). Na segunda, Moisés e o povo erguem a Tenda, exatamente como Deus os tinha orientado (40.16-33).

O dilúvio durou, ao todo, um ano (Gênesis 7.6; 8.13). Aí começou uma “nova criação”, uma nova etapa nas relações de Deus com Seu mundo. Assim também agora (Êxodo 40.17). Um ano depois que o povo atravessou o mar e começou Sua peregrinação pelo deserto, começa uma nova etapa. Deus vem acampar no meio do Seu povo (Êxodo 40.34).

Dia 91 – Ano 1

Êxodo 38 — 39

Êxodo 38 — 39

A descrição de como a Tenda foi feita exatamente como Deus tinha mandado fazer, prossegue. Ela se estende ao espaço externo da Tenda: o altar dos holocaustos (Êxodo 38.1-7), onde se faziam os sacrifícios pelos pecados; a bacia de bronze (38.8), onde os sacerdotes se lavavam; e o pátio (38.9-20), onde ficavam as pessoas. Terminada a descrição, é feito um inventário do material usado na construção (38.21-31). Por fim é relatado como foram feitas as vestes dos sacerdotes (39.1-31).

O relato segue em frente quase sem respirar, tal é o suspense: será que tudo seria feito conforme a instrução divina? Quando vem o inventário do material (38.21-31), se constata: “Fez … tudo que o Senhor tinha dito a Moisés” (38.22). No capítulo seguinte, esta constatação é repetida, alegremente, sete vezes (39.1,5,7,21,26,29,31). As sete declarações de que tudo tinha sido feito conforme a orientação divina, remetem ao relato da criação em sete dias. O relato todo (Êxodo 36-39) termina com uma recapitulação solene (39.32-43) de tudo que tinha sido feito. Este sumário final se espelha no relato da criação. 

A estrutura da Tenda, como um todo, lembra a criação em um aspecto importante: ela espelha a constituição do ser humano, imagem de Deus. O pátio externo representa o mundo corporal, “concreto”. O mais interior, o Santíssimo, representa o espírito humano, onde Deus habita e de onde Ele quer nos guiar e abençoar. O Lugar Santo, entre os dois, representa a alma, a estrutura psíquica do ser humano, voltada de um lado para Deus e de outro lado para a comunidade humana. Assim a Tenda dá testemunho da Presença divina no mundo espelhando Sua Presença no ser humano. Mundo dividido, ser humano dividido, mas com a promessa de re-integração sinalizada por essa Presença divina. 

A Tenda inaugura a nova criação. Nela se expressa a reconciliação que Deus estenderá a todo o universo. O começo dessa recapitulação (39.32, “Assim se concluiu toda a obra da Tenda…”) lembra Gênesis 2.1, que sumaria o relato da criação. O fim dessa recapitulação (39.42-43) também usa uma linguagem que compara a construção da Tenda com a criação do mundo. O v.42 diz “…e assim fizeram os filhos de Israel toda a obra”. E o v.43: “Viu Moisés toda a obra … e Moisés os abençoou”.

Dia 90 – Ano 1

Êxodo 36 — 37

Êxodo 36 — 37

Sob uma liderança que tinha sido ensinada por Deus a fazer a obra “conforme tudo que o Senhor havia ordenado” (Êxodo 36.1), tem início o mutirão da construção da Tenda. Não demora muito, um aviso tem que ser dado, para que não se traga mais nada. Já havia “muito mais que o necessário” (36.5). Estava dando certo!

Começa agora o que para nós é um tedioso relato de como os artesãos fizeram a Tenda. Começa em Êxodo 36.8 e vai até o fim do capítulo 39. Lendo o relato das instruções para a construção da Tenda (Êxodo 25 — 31), vemos ainda que aqui se repete o que lá havia sido dito. Só que lá a perspectiva é futura (“farás”) e aqui é passada (“fez”). Este longo trecho, que diz tudo de novo, quer nos fazer pensar.

A paciência e a meticulosidade do relato são parte de sua mensagem. O que está em jogo aqui é tão importante, que nada pode ser deixado ao acaso. Cada detalhe é repetido, como que para se certificar de que as instruções divinas se cumprem em detalhe. O relato todo parece tão concentrado em observar que tudo estava sendo feito direitinho, que não pára nem para respirar. Assim Deus pode ter se sentido naqueles dias. E assim Ele deve se sentir muitas vezes ao observar a nossa vida, também!

Primeiro é feita a tenda (36.8-18) com as lonas que a cobriam (36.19) e a cerca que a rodeava (36.20-34). Criado o espaço interno, ele agora é dividido (36.35-38). Então é feita a arca, que era um baú contendo os Mandamentos (37.1-5); e o propiciatório, o “lugar de onde Deus se mostrava propício”, que era a tampa do baú (37.6-9), coberta pelos Anjos da Presença. O conjunto era uma só peça, e seu lugar era o Santíssimo. Depois foi feito o que ficava no Lugar Santo, que era a parte coberta do espaço intermediário entre o lugar de Deus e o do povo: a mesa (37.10-16), o candelabro (37.17-24), o altar do incenso (37.25-28) e o óleo da unção e o incenso (37.29). A estrutura do candelabro, de uma árvore com tronco e sete ramos, lembra a árvore da vida do paraíso. Ele está colocado em frente ao véu que separa o Santíssimo do Lugar Santo, sinalizando que este seria agora o caminho para o Paraíso. O véu ainda separa. Mas agora iluminado pelo candelabro.

Dia 89 – Ano 1

Êxodo 35

Êxodo 35

O recomeço, depois da crise, significa ir em frente. Deus quer morar com Seu povo. Mas para isso, tudo tem que ser feito de um jeito que não ponha em risco o Seu propósito maior, de um dia morar de novo com todas as Suas criaturas neste mundo.

Em Êxodo 35 começam os preparativos para a construção da Tenda em que Deus acampará com os israelitas. De tão importante que esta Tenda é, seis capítulos foram usados para descrever em detalhes como ela devia ser. E agora mais quatro descreverão sua construção. Pois a Tenda aqui da Terra devia corresponder perfeitamente à Tenda do céu, que foi mostrada a Moisés. Só assim, o céu “desceria” à terra e se conectaria a ela. Aquele lugar, tal como a escada do sonho de Jacó, seria o “portal do céu” (Gênesis 28.17). Ali estariam presentes as energias da eternidade, ali começaria a se realizar a reconciliação que Deus quer um dia estender a todo o universo.

Como Moisés fora convocado a talhar as pedras onde Deus escreveria os Mandamentos (Êxodo 34.1), agora também o povo é convocado a colaborar na obra de Deus. Quem tivesse o coração movido, que trouxesse voluntariamente sua oferta (Êxodo 35.5). As pessoas com habilidade para ajudar em algum aspecto na construção da Tenda, que se apresentassem (35.10). Havia uma lista de tudo que precisava ser feito (v.11-19). A resposta do povo foi pronta e generosa (v.20-29). Por fim, são apresentados os que coordenarão o trabalho (v.30-35). Muita gente com “coração disposto” (v.21,26,28), querendo ajudar na construção da Tenda. Um belo testemunho de como se pode sair fortalecido de uma crise.

Também nós temos nossas crises, e podemos ser gratos a Deus por pessoas que, como Moisés, intercedem por nós. E pelos nossos mais fiéis intercessores: Jesus (Hebreus 7.25) e o Espírito Santo (Romanos 8.26).

Dia 88 – Ano 1

Êxodo 31

Êxodo 31

Neste capítulo (Êxodo 31) chegamos ao fim das instruções para a construção da Tenda de Deus. A última instrução diz respeito às pessoas que iriam construí-la. Também elas escolhidas pelo próprio Deus (Bezalel, v.2; Aoliabe e mais um grupo de assistentes, v.6). O relato destas instruções, que havia começado em Êxodo 25, termina agora com um inventário (31.7-11) de “tudo que foi ordenado” (v.11). Chama a atenção aqui que o artesão é “enchido do espírito de Deus” (v.3), e que isso lhe dá sabedoria, inteligência, conhecimento existencial e habilidade prática, como diz o texto. Esta descrição é reconciliadora, em mais de um sentido.

Primeiro, ela reconcilia o “espiritual” com o “mundano”. O homem é cheio do Espírito, e o que isso lhe traz? Capacidades “mundanas”! Na verdade, aqui já não podemos mais separar estas “esferas”, como fazemos em nosso mundo danificado pelo pecado. A construção da Tenda é um exercício de mundo reconciliado. Reconciliação entre o divino e o humano, entre o espiritual e o mundano.

Segundo, temos aqui uma reconciliação dentro do próprio ser humano. A divisão entre o “racional” e o “não-racional”, entre teoria e prática, não existe aqui. Nosso texto amplia a noção de “inteligência”, juntando-a com sabedoria, conhecimento existencial e habilidade prática.

O capítulo termina (Êxodo 31.12-18) com dois elementos que são símbolos dessa reconciliação, apontando para ela e, pela sua observância, assegurando a presença constante dela: o shabat (que a palavra “sábado” já não representa bem) e os Mandamentos. Shabat e mandamento não foram dados para separar. Foram dados para (re)unir, para integrar. Fazendo-nos interromper a rotina do cotidiano, eles nos tornam conscientes de um mundo reconciliado, e alimentam nossa esperança.

Dia 84 – Ano 1

Êxodo 30

Êxodo 30

Continuam as instruções para o exercício do sacerdócio. Primeiro se fala do altar para o incenso (Êxodo 30.1-10). Cada rito será acompanhado por queima de incenso, tanto os do amanhecer como os do entardecer (v.7-8). Aqui de novo, não se trata de uma formalidade. Trata-se de orar pelo povo, de interceder pelas pessoas às quais as oferendas e os sacrifícios se referem. 

O incenso chegando ao nariz de Deus (!) é a intercessão amorosa que chega ao Seu ouvido e ao Seu coração. O incenso chegando ao nosso nariz, quer nos lembrar que também nós estamos sendo libertados por Deus, para nos colocar a serviço do nosso próximo.

Os v.11-16 tratam de um assunto mais “profano”, mas sem o qual o sacerdócio não se viabilizará neste mundo em que vivemos. O povo é chamado a sustentar financeiramente o sacerdócio. Os v.17-21 mostram que os sacerdotes não podem se aproximar de Deus sem se lavar. O salmo 51 devia estar no coração de um sacerdote sempre que se aproximasse de Deus. Nos seus lábios, a súplica: “lava-me da minha iniquidade” (Salmos 51.2). E mãos limpas (Salmos 24.4) significam mãos que aprenderam a lavar as feridas do povo, e não estão elas próprias sujas do sangue do próximo (cf. Isaías 1.6,15).

As últimas disposições deste capítulo dizem respeito à manipulação do óleo com que os sacerdotes seriam ungidos (Êxodo 30.22-33) e do incenso que seria queimado (30.34-38). Tanto um como outro deveriam ser especiais, nunca usados no dia a dia. Pois isso é uma das coisas que o povo precisa aprender: saber do seu espaço e, assim, respeitar o espaço de Deus. E assim Deus virá e acampará no meio do povo, como diz o fim do capítulo anterior (29.43-46). “E habitarei no meio dos filhos de Israel, e serei o seu Deus” (Êxodo 29.45). O Deus que os tirou do Egito para morar com eles, e a partir deles voltar um dia a morar com a humanidade toda.

Dia 83 – Ano 1

Êxodo 29

Êxodo 29

No capítulo anterior vimos como foram pensadas, em detalhes, as vestes que os sacerdotes usariam para exercer a sua função. Em Êxodo 29 são planejadas, meticulosamente, as cerimônias de consagração desses sacerdotes. Não é simplesmente dizer “você e você”, e já temos as pessoas que farão a mediação entre o povo e Deus e entre Deus e o povo. Não são decisões nossas que tornam uma pessoa apta para essa tarefa. 

As pessoas escolhidas por Deus precisam passar por ritos que as “santificarão”, as “colocarão à parte”, as separarão para este serviço. Só assim elas poderão pisar o novo espaço criado para ficar entre o espaço do povo (o pátio) e o espaço de Deus (o Santíssimo), e ali realizar as expiações e purificações dos pecados e das impurezas que continuamente nos separam de Deus. Essa é a ideia da instituição do sacerdócio, que vai ser tão importante na vida dos israelitas. 

No capítulo 28 vemos que os nomes das doze tribos de Israel estariam inscritos sobre o “peitoral”, a parte de cima da veste sacerdotal (Êxodo 28.15-21). O sacerdote levará os nomes dos israelitas no peito, no coração, quando se aproximar de Deus (28.29-30). E Deus se lembrará do Seu pacto amoroso com Seu povo. Essa é a essência do sacerdócio. Todo o restante das atividades ligadas a esse ofício não deveria nos fazer esquecer isso, a única coisa que realmente importa.

“Levar no coração”, aqui não deveria, como nada nestes capítulos deveria, ser uma formalidade. A mensagem ligada ao sacerdócio, por enquanto tarefa de algumas pessoas escolhidas, quer preparar o povo para um dia serem todos sacerdotes, levando uns aos outros no coração. Até lá ainda haverá muito chão. Andando é que se aprenderá.

Dia 82 – Ano 1

Êxodo 28

Êxodo 28

Aqui vemos como será o trabalho dos sacerdotes no Lugar Santo da Tenda de Deus. Os sacerdotes farão a mediação entre o povo, cujo lugar é o pátio externo, e Deus, que “mora” no Santíssimo, na parte mais interna da Tenda. Arão, irmão de Moisés, e seus filhos (Êxodo 28.1) serão consagrados para esse serviço. Todo o capítulo 28 é sobre as vestes que os sacerdotes usarão ao oficiar.

Por que um capítulo inteiro da Bíblia para explicar em detalhes a roupa com que os sacerdotes realizarão seu ofício? A pergunta reflete dois problemas dos quais é importante se conscientizar. Primeiro, não deveríamos, desde o nosso momento na história, julgar os momentos anteriores. Deus não faz tudo de uma só vez. Ele quer que o povo compreenda o que se passa, e que colabore voluntariamente. E isso pode levar tempo. 

Segundo, a mensagem central aqui continua tão importante hoje como era na época. Deus é Deus. No paraíso, os humanos pensaram que poderiam ser “como Deus”, no sentido torcido que a serpente lhes sugeria. Não se tornaram como Deus, e também deixaram de ser “humanos”. A transgressão da determinação divina introduziu um processo de desumanização, do qual a vida diária ainda hoje nos faz dolorosamente conscientes.

O fato de os israelitas precisarem cuidar, nos mínimos detalhes, da forma como se aproximam de Deus, quer inculcar isso. Cada detalhe aí é previsto pelo próprio Deus, nada fica ao nosso arbítrio. Nesta questão absolutamente fundamental para a vida humana e do planeta, quando fazemos do nosso jeito, fazemos mal. Aprender a parar. Aprender a se aquietar. Aprender a se deixar instruir. Aprender a fazer do jeito como foi instruído. Esta será a lição de cada dia. O restante da narrativa bíblica mostrará quão difícil é isso. E nos trará histórias e exemplos, lições e admoestações, para aprendermos a aprender.

Dia 81 – Ano 1